Gilson Guimarães da Silveira
Textos


RECLAMAR POR QUÊ? RECLAMAR DE QUÊ?
 
 De repente fiquei irritado (como vocês às vezes ficam) por não conseguir acessar a internet - essa tralha que nos deixa dependentes de suas vontades. 
 Aconteceu anteontem. Eu estava cheio de ideias; amanheci cheio de assuntos para desenvolver em crônicas, mas deixei para a tarde; aí, quando fui me plugar (termo antipático!), havia ameaça de vírus. 
 Rodei daqui, dali, arrisquei acessar uma, cinco, dez vezes... Nada! 
 Desconfio que alguém  do bairro  faz exercícios caseiros de mau-caratismo, pois a coisa acontece sempre às mesmas horas da tarde. Já constatei isto; ao que tudo indica, o trampicola dorme a manhã inteira, descansa, e recomeça as travessuras após almoçar. É um babaca. 
 Ainda agora antecipei-me ao fulano; pluguei-me antes dele iniciar a sessão de pilantragem.              
 ...Mas, toda aquela inspiração matutina de anteontem, foi-se (e com ela a irritação, felizmente).
 (...) 
 É impressionante a capacidade que temos de nos contrariar. Por mínima coisa nos contrariamos, ficamos azedos. 
 Lembro de minha avó materna e seu pedaço de pão. Ela jamais comia pão fresco. Nós o comprávamos para o café da tarde e antes de qualquer um de nós ela o cortava, tirava uma pequena fatia da parte interna e a guardava no guarda-louças, para ser consumida no dia seguinte. Dizia que de um dia para o outro a fermentação se completava e a digestão ficava fácil. 
 Nunca esqueci. Tenho minhas birras, tenho minhas contrariedades, minhas... fermentações. Às vezes (não muitas vezes) consigo deixá-las no meu guarda-louças, suportá-las, sem explodir. Vou dormir e no dia seguinte, tudo está bem, a fermentação já ocorreu e a digestibilidade, garantida, sem problemas.
 ...Realmente, como se diz, "o travesseiro é bom conselheiro"; e eu acrescento: é como um bom licor que auxilia a digestão. 
 (...)
 Nesses dias de "fazer nada, mas, só nadar" (e nado um pouco melhor que pessimamente!) conheci um homem e sua família, na praia.
 Todo dia eu observo pai e filha. Todo dia eu os encontro na praia fazendo a mesma coisa.
 Moram longe, a quinhentos quilômetros. Mas todo ano voltam aqui, para o banho de mar. Desde o tempo em que o pai levava a filha nos braços, para o encontro com as ondas.
 Naturalmente, a filha cresceu. Naturalmente, ele já não consegue levá-la nos braços... São vinte e quatro anos, fazendo a mesma coisa. Portanto, de há muito ele a leva nos ombros.
 ...E todo dia eu os encontro sorrindo, aproveitando as belezas da vida:  
 ...ao pai não parece pesar, a cruz; pois que a filha, deficiente, jamais foi cruz para ele...
 ... - e isto se lê nos sorrisos que ambos estampam nos rostos, quando vão se dirigindo de encontro às ondas, ela no ombro dele; 
  ...sorrisos que se corroboram;
  ...de cumplicidade;           
  ...sorrisos de quem verdadeiramente se ama.  
  (...) 
  ...E ficamos eu, muitos de vocês, nós todos, enfim - que temos nossos braços perfeitos, nossas pernas perfeitas, nossas cabeças perfeitas - a resmungar por coisinhas, a reclamar de possíveis contaminações por viroses internéticas!...
 ...Pílulas!
 ...Vamos todos tomar banho!
 ... - de mar, preferentemente.
 (...)

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 ...Reclamar por quê? Reclamar de quê?   
           
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Fev.23, 2013

          
Guimaraens Esse
Enviado por Guimaraens Esse em 23/02/2013
Alterado em 19/01/2016
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